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Explorando Territórios de Vida em Portugal

Um novo relatório, que tem o apoio do Consorcio ICCA, explora a governação comum dos recursos naturais e o significado de comunidade no contexto português

Compartes do Movimento pela Conservação e Desenvolvimento dos Baldios de Serpins (MCDBS) em busca de pontos de referência e conhecimento sobre seu território em janeiro de 2020. Foto: Rita Serra

First published on 02/02/2022, and last updated on 02/08/2022

Por Sergio Couto (Coordenador Regional para a Europa)

https://www.iccaconsortium.org/wp-content/uploads/2022/02/2021-serra-gama-pt-icca-en-portugal.pdf“Territórios e Áreas Conservadas por Povos Indígenas e Comunidades Locais (ICCAs) em Portugal”, um novo relatório de autoria de Rita Serra e João Gama Amaral, foi publicado no final de 2021 pelo Consorcio ICCA com cofinanciamento de Trashumancia y Naturaleza, Fundação MAVA, International Land Coalition e Common Lands Network. O relatório explora a governação comunitária no Portugal atual e, mais especificamente, quais exemplos e experiências repercutem fortemente no espírito e no entendimento dos territórios de vida. Rita e João propõem os baldios como os ICCAs potenciais em Portugal. Estas são terras comunitárias localizadas principalmente em áreas da serra em Portugal continental, que têm sido cruciais para a sobrevivência dos povos e sua conexão com a serra desde tempos imemoriais.

Ao considerar e tentar entender melhor sua situação atual, a arborização estatal de terras comuns foi um evento chave que rompeu a relação entre os povos e a serra. Após a Revolução dos Cravos (abril de 1974) e a democratização do Estado, essas terras foram restituídas às comunidades locais de compartes que as reivindicaram, permitindo-lhes o direito de as autoadministrar. Entretanto, muitas comunidades serranas já tinham sido extintas, despovoadas ou urbanizadas com a expansão de cidades próximas, criando lacunas intergeracionais no conhecimento, memória e conexão com a terra.

Atualmente, os baldios enfrentam muitas tensões e conflitos entre comunidades de compartes, juntas de freguesia e municípios, outras organizações coletivas de proprietários florestais, indústrias como a extração mineira, plantações de árvores, parques eólicos e outros usos econômicos que afastam ainda mais a população dos usos e benefícios locais dos baldios. Além disso, os incêndios florestais devastam e transformam a paisagem dos baldios de forma recorrente. Contudo, a longa história dos baldios e a flexibilidade da lei constituem recursos culturais e legais para desenvolver formas criativas de traduzir continuamente os esforços dos baldios para conservar a floresta e a natureza sob a governação comunitária em bem-estar local, sempre que as comunidades de compartes procurem atingir o bem comum. Por exemplo, esquemas colaborativos no combate a incêndios entre o Estado e as comunidades de compartes (sapadores florestais) possibilitaram pela primeira vez recursos técnicos, recursos humanos e equipamentos necessários para que as comunidades se envolvessem na administração florestal.

Cabras que pastam no baldio de Ansiães. Foto: Marta Nieto-Romero

Rita e João descrevem três potenciais ICCAs em Portugal: dois casos bem documentados, potenciais ICCAs exemplares (Vilarinho na Serra da Lousã e Ansiães na Serra do Marão) que estão atualmente autogerindo as florestas de baldios e um exemplo de um ICCA desejado por um movimento de compartes com o objetivo de recuperar democraticamente os baldios da Junta de Freguesia e do Estado (Serpins, Serra da Lousã).

Como conclusão geral, em Portugal os baldios podem contribuir para uma governação local eficaz, equitativa e vital da terra, da água, dos recursos naturais, da conservação da natureza e da diversidade biológica e cultural, para a soberania alimentar e os meios de subsistência, e para a prevenção e mitigação de desastres naturais, especialmente incêndios florestais, sempre que a comunidade local seja capaz de mobilizar o quadro institucional dos baldios para colaborar e, quando for preciso, para corrigir os abusos perpetrados por instituições coletivas e privadas que se desviam do bem comum. Assim, uma das principais recomendações é facilitar o apoio jurídico a grupos de compartes que tenham como objetivo reverter a usurpação das instituições e terras dos baldios, através da corrupção ou do crime.

As recomendações incluem tornar visíveis os baldios em documentos oficiais; promover as boas práticas; fortalecer a conexão entre a população local e a terra através de produtos florestais não madeireiros; e abordar a lacuna geracional na memória e no conhecimento através de diversas formas de educação e aprendizagem informais.

Baixe o relatório em inglês ou em português.

Tradução de Camila Miranda Reyes